O jurista Miguel Reale Junior, um dos autores do pedido de impeachment da presidente Dilma Rousseff, em análise na Câmara, defendeu que as chamadas pedaladas fiscais constituíram crime de responsabilidade e, por isso, justificam o impedimento da petista.
Em audiência na comissão especial da Casa que avalia a abertura do processo de impeachment, Reale afirmou que as manobras "falsearam" a situação fiscal do governo e trouxeram "consequências gravíssimas" para os mais pobres.
Ele afirmou que as pedaladas foram um artifício usado para esconder um déficit fiscal, por transformarem "despesa em superávit primário". O jurista defendeu ainda que essas manobras, caracterizadas pelo atraso no repasse de recursos a bancos públicos para pagamentos de programas do governo, configuraram-se como empréstimos de bancos públicos à União, o que é vedado pela lei.
Reale apontou ainda a edição de créditos suplementares por parte do governo sem a autorização prévia do Congresso, o que seria vedado, por desrespeitar a Lei Orçamentária Anual (LOA). "Crime não é apenas por a mão no bolso do outro e tirar dinheiro", disse Reale. "É tirar desse país a capacidade de desenvolvimento."
Outra autora da denúncia contra Dilma, a professora da faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP) Janaina Paschoal afirmou que as pedaladas aconteceram porque "do outro lado estava ocorrendo uma sangria". "Estamos diante de um quadro em que sobram crimes de responsabilidade", disse.
Pouco depois da exposição dos advogados, houve tumulto na reunião da comissão especial da Câmara. O presidente do colegiado, deputado Rogério Rosso (PSD) foi acusado de manobrar a reunião a pedido do presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB) para favorecer os parlamentares favoráveis ao impeachment.
O que diz a defesa
O governo argumenta que as manobras fiscais que ficaram conhecidas como pedaladas foram atrasos em contratos de prestação de serviços celebrados com instituições financeiras públicas e não operações de crédito.
Governistas defendem que os créditos não feriram a lei orçamentária e que nem os decretos e nem as pedaladas podem ser caracterizados como crimes de responsabilidade, única condição jurídica para sustentar um impeachment da presidente.
O pedido de impeachment de Dilma, em análise na comissão especial, foi redigido por Reale, Janaina e pelo jurista Hélio Bicudo. Se houver sessões da Câmara em todos os dias úteis desta semana, a presidente tem até a segunda-feira para apresentar sua defesa à comissão. Saiba quais são as próximas etapas do processo de impeachment.
Dilma: "Impeachment sem crime de responsabilidade é golpe"
Em cerimônia de lançamento da terceira fase do Programa Minha Casa, Minha Vida, no Palácio do Planalto, a presidente Dilma Rousseff voltou a afirmar na quarta-feira que o processo de impeachment é golpe porque não há crime de responsabilidade, apesar de o instrumento jurídico estar previsto na Constituição.
"É absolutamente má-fé dizer que, por isso, todo impeachment está correto. Para estar correto, a Constituição exige que se caracterize crime de responsabilidade. Impeachment sem crime de responsabilidade é golpe. Não adianta fingir que nós estamos discutindo em tese o impeachment. Estamos discutindo um impeachment muito concreto e sem crime de responsabilidade", disse.
Questionado por jornalistas após as declarações da presidente, o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Marco Aurélio disse que o processo pode "transparecer como golpe" se não houver fato jurídico para justificar o impedimento.
"Precisamos aguardar o funcionamento das instituições. Precisamos nesta hora é de temperança. Precisamos guardar princípios e valores", disse o ministro.
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