sexta-feira, 1 de abril de 2016

OS VERDES E O NOVO PODER NA ALEMANHA (Luiz Augusto Ramalho)

OS VERDES E O NOVO PODER NA ALEMANHA

Luiz Augusto Ramalho
Ao assumir o comando do país em outubro, o chanceler Gerhard Schroeder constituiu o primeiro governo "verde e vermelho" da Alemanha, aliando o centenário Partido Social Democrata (PSD) com o adolescente Partido Verde (PV). Logo nos primeiros dias, o Verde Josef "Joschka" Fischer, nomeado vice-chanceler e ministro das Relações Exteriores, visitou a França, a Inglaterra, a Polônia e os Estados Unidos para mitigar a curiosidade e a desconfiança da comunidade internacional acerca dos primeiros passos dos Verdes no poder.
Embora existam outros partidos Verdes governando, por exemplo, a França e a Suécia, a chegada dos Verdes alemães ao governo federal tem uma significação história. Na Alemanha, o PV foi o primeiro partido a se lançar na arena política para representar os novos movimentos sociais surgidos nos anos 70. Em primeiro lugar, os movimentos ecológicos que, naquele momento, levantavam vigorosamente sobretudo a bandeira do combate à utilização de energia nuclear. Paralelamente, as chamadas "Iniciativas dos Cidadãos" (Bürgerinitiativen), movimentos pontuais, como contra a construção de rodovias, que reagiam contra decisões arbitrárias do Estado e dos Municípios; o forte movimento pela paz, que procurava impedir a colocação de novos mísseis de médio alcance na Alemanha; o movimento feminista que procurava nos Verdes uma nova forma de fazer política, permeável à participação das mulheres (e, desde sua constituição, foi introduzida a quota de 50% para mulheres em todos os níveis de atuação do partido); o movimento de solidariedade com os países do chamado Terceiro Mundo.
O Partido Verde absorveu ainda quadros dos pequenos grupos neocomunistas dos anos 70, oriundos do movimento estudantil de 1968, que se dissolviam à época. Temos assim a descrição de um partido inovador, questionador da cultura política tradicional e até da própria figura do político profissional. Importante também foi a integração do Partido Aliança ‘90 (Bündnis ’90) no início da década. Este partido, formado por opositores ao regime da Alemanha Oriental, com ativa participação no processo que levou à queda do Muro de Berlim, introduziu os Verdes nas regiões dominadas por 40 anos de Socialismo real. Em seu trajeto de duas décadas, os Verdes passaram por sérios conflitos internos. Hoje, se dividem em duas correntes: a corrente "realista", chefiada por Joschka Fischer, e a corrente de esquerda, representada por Jürgen Trittin, atual ministro do Meio Ambiente.

Muito além da Ecologia

Os Verdes nunca foram somente um partido da Ecologia. Direitos humanos, direitos individuais, multiculturalidade e integração de estrangeiros, solidariedade internacional, combate à discriminação das mulheres, participação dos cidadãos nas decisões politícas, anti-racismo, pacifismo são tópicos que sempre pertenceram ao seu repertório programático. Muitos destes assuntos, lançados pelos Verdes principalmente no campo da Ecologia, foram absorvidos pela opinião pública e passaram a fazer parte hoje dos programas de outros partidos políticos.
Os próprios Verdes descobriram que os temas sociais e econômicos são imprescindíveis para um partido que quer governar no nível federal - os Verdes já vinham integrando alguns governos estaduais e inúmeros governos municipais antes de comporem o atual Executivo federal. Conseqüentemente, as prioridades defendidas nesta campanha eleitoral passaram pela questão do combate ao desemprego, da reforma do sistema de saúde e de aposentadorias e, principalmente, da reforma fiscal. A introdução de impostos que penalizam o uso intensivo de recursos naturais e de energia e aliviam os custos sociais bem como a chamada reforma fiscal ecológica se transformaram no carro-chefe do programa do partido.
Mas, o que poderá mudar com os Verdes no poder? Na política externa da Alemanha, pouca coisa. No âmbito das negociações de tratados internacionais, como os extraídos da Rio 92 ou em Kioto, em 1997, a posição alemã já tem sido uma das mais progressistas entre os países industrializados. Isto será reforçado pelos Verdes, como a 4ª Conferência das Partes da Convenção sobre Mudanças Climáticas - que ocorreu em Buenos Aires na primeira quinzena de outubro - deverá demonstrar. Na esfera da cooperação técnica, com uma secretária de Estado verde no ministério (Ursula Eid), os projetos e programas de combate à pobreza, de apoio a mulheres e de cooperação ambiental serão reforçados ainda mais.
A reforma fiscal ecológica estará dando seus primeiros e tímidos passos com o encarecimento dos preços de energia elétrica e do combustível. Com a concessão generosa da nacionalidade alemã e a permissão de dupla nacionalidade a estrangeiros estabelecidos na Alemanha há mais de sete anos, calcula-se que mais de 4 milhões de estrangeiros, a maioria turcos, solicitem a naturalização. E os Verdes conseguiram um acordo para que, no próximo ano, um programa visando a eliminação progressiva da utilização da energia nuclear seja estabelecido entre o governo e as empresas de energia.
Depois de 20 anos de luta, pelo menos neste ponto o velho movimento antinuclear conseguiu, pragmaticamente através dos Verdes, se impor.

VICE-CHANCELER FOI MOTORISTA DE TÁXI

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O novo ministro, Joschka Fischer

Três ministérios (Relações Exteriores, Meio Ambiente e Saúde), cinco secretarias de Estado - entre elas, a da cooperação técnica internacional - e mais alguns cargos no primeiro e no segundo escalões foram legados pelos Verdes na partilha com o vitorioso PSD.
A biografia dos três ministros bem demonstra a origem dos Verdes alemães. Joschka Fischer, escolhido ministro das Relações Exteriores, foi motorista de táxi, chefe de "segurança" do grupo Luta Revolucionária (início dos anos 70) e primeiro-ministro Verde num governo estadual em 1984. Naquela época fez questão de vestir um tênis para sua cerimônia de posse.
Jürgen Trittin, que agora ocupa a pasta do Meio Ambiente, é sociólogo, oriundo do grupo maoísta KB. E Andrea Fischer, atual ministra da Saúde é uma ex-tipógrafa, hoje especialista no setor de Saúde. Todos têm entre 35 e 50 anos.
Luiz Augusto Ramalho é chefe de Departamento
de Proteção do Meio Ambiente e Recursos
Naturais da Carl Duisberg Gesellschaft/ Berlin.

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