sexta-feira, 30 de outubro de 2015

Islamismo e Meio Ambiente (islamismomeioambiente.blogspot)

Religião X natureza no Islã


Os muçulmanos acreditam que o Islã é mais do que uma religião. É um modo abrangente de vida, cujos ensinamentos cobrem todas as relações humanas, inclusive com o mundo natural. Tal visão, que é holística, pressupõe um elo fundamental entre todos os elementos que constituem a natureza.
Para que se entenda melhor a relação entre a religião muçulmana e a natureza, creio ser necessário a explicação de alguns princípios e dogmas fundamentais que procurarei elucidar nos próximos itens. Posteriormente farei um breve levantamento de como os muçulmanos utilizam a natureza e seus espaços do ponto de vista da sharia, a lei islâmica.
  1. Princípios que sustentam a doutrina islâmica referentes à natureza.
São quatro os princípios de sustentabilidade do Islã: tawhidfitramizankhalifa. ISLAM (2004) também inclui outro princípio: amana.
tawhid é o maior e mais importante de todos, significa a unicidade de Deus. No Islã a unidade de Deus (Ele é único) corresponde à unidade da criação e infere-se que, todos os seres provem da ação criadora d’Ele, portanto, todos estão conectados entre si.
fitra, ou princípio da criação, demonstra que a diversidade das criaturas (biodiversidade, etnias, culturas) não determina nenhum tipo de maldade, sendo que o mal e os conflitos existentes surgem por causa do egoísmo e afastamento das verdades divinas por parte dos seres humanos.
mizan, ou princípio da balança, diz que toda a criação de Deus tem uma ordem e um propósito previamente estabelecido pelo Criador, portanto, tudo se conecta em equilíbrio. Quando os seres humanos interferem na natureza tem a capacidade de preservá-la ou destruí-la.
khalifa é um dos princípios mais importantes para que entendamos a relação do muçulmano com o meio natural. A palavra khalifa (em português “califa”) significa legatário, representante ou vice-regente. Segundo a doutrina islâmica, Deus confiou ao ser humano Sua criação, portanto ambos os princípios, khalifa e amana (confiança) estão ligados. Os seres humanos representam Deus na terra e devem respeitar Suas leis, rendendo-se a elas em quaisquer circunstâncias. Vem daí o termo muçulmano, derivado do árabemuslim, ou seja, o que é submisso à vontade de Deus.
É importante ressaltar que, segundo o Alcorão, Deus tudo criou com um propósito. Sendo que, primeiramente, os seres humanos foram criados para servi-Lo. Já o restante da Criação para louvar a Deus e servir ao s seres humanos. Entretanto, o ser humano foi criado com uma característica peculiar – o arbítrio moral, para que realize boas obras, incluindo o trato correto da natureza, preservando-a para as gerações futuras.
2. Como os muçulmanos devem agir individualmente em relação à natureza.
Para o Islã a responsabilidade final pela ação correta encontra-se no indivíduo, que será julgado no Dia do Juízo Final, independentemente do que os governantes fizeram ou fazem.
Daí se conclui que a proteção, conservação e desenvolvimento do meio ambiente e dos recursos naturais é um dever obrigatório para todo muçulmano (CISSE, s/d).
Segundo as palavras do Profeta Muhammad “não deve haver nenhum dano ou imposição de danos” e “a preservação de danos e corrupção antes que ocorram é melhor do que depois de ocorrerem” (CISSE, s/d).
Neste sentido, a sharia estabelece as seguintes diretrizes:
  • Recuperação de terras (Ihya);
  • Estabelecimento de reservas / zonas protegidas (Hima e Harim);
  • Zoneamento e planejamento do uso da terra (Haram);
  • Caridade e doações (Waqf).
2.1– Recuperação das terras (Ihya).
Os muçulmanos são estimulados, tanto pela necessidade de sobrevivência como pela prática do bem ao próximo, ao “reavivamento” das terras. Isto tem ocorrido especialmente em áreas onde houve um intenso crescimento demográfico, em áreas desérticas ou semidesérticas e também em áreas cujo solo perdeu sua capacidade de produção devido á práticas exaustivas e/ou inadequadas (SAFAR, 2007).
2.2- Reservas e zonas protegidas (Hima e Harim).
São zonas e áreas de proteção nas quais não há cultivo. Podem tanto pertencer a um indivíduo quanto à grupos indefinidos de pessoas, como os moradores de uma aldeia.
Nessas zonas encontram-se nascentes e cursos d’água. Nelas, a lei islâmica proíbe os assentamentos humanos, atividades industriais e o pastoreio intensivo. No caso de ser uma zona florestal, a exploração dos recursos é limitada, sendo permitida parcialmente apenas em determinadas épocas, como as de escassez, e a atividades que não causem danos permanentes. É importante lembrar que a caça por esporte é proibida no islã, portanto, existe a idéia de permissibilidade da caça aos animais existentes em tais zonas, mas apenas para alimentação em épocas de extrema necessidade. Em outras circunstâncias, tudo o que for retirado deve ser devolvido e o infrator punido.
A principal diferença entre harim e hyma se refere à localização e administração. As zonas harim são administradas a nível local e as hymapodem estar em regiões distantes dos centros urbanos, sendo controladas pelo governo central.
Caso interessante são as cidades de Meca e Medina. Ambas são hyma. Segundo o Islã, Abraão estabeleceu a primeira hyma em Meca, já Medina foi tornada hyma por Muhammad.
Península Arábica o número delas tem diminuído a cada ano. Em 1965 havia 3 mil deste tipo de zonas. Atualmente estão ligadas às necessidades das pequenas comunidades aldeãs. Na Arábia Saudita para que uma área seja proclamada hyma primeiro a decisão é votada pelos aldeões e, depois, ratificada pelo chefe local. (SAFAR, 2007).
2.3 - Caridade e doações (Waqf).
Waqf é uma espécie de doação (caridade) feita por indivíduos à comunidade, visando seu bem-estar. Não pode ser alienada, vendida ou encoberta (seu uso e propósito). Consiste geralmente em áreas que variam de tamanho, que passam a ser administradas através de um fundo perpétuo fiscalizado pelo juiz local, o Qadi.
Exemplos de waqf são terras onde foram construídas escolas (madrassas), mesquitas, poços, fontes, hospitais, bibliotecas, etc.
Fontes pesquisadas:
BOUÇÓS, Hugo D. B. ; JORGE, Fernando M. C. S. A proteção ambiental na doutrina islâmica. Revista da Faculdade de Ciências Humanas e Sociais. Porto: Universidade Fernando Pessoa, 2005.https://bdigital.ufp.pt/dspace/handle/10284/663
CISSE, Tony. Islam, the environment and the use of Vetiver Grass.
htpp://www.vetiver.org/SEN-cisse2.pdf
ISLAM, Muhammad Muinul. Towards a green earth: an Islamic perspective. Asian Affairs, vol. 26, n. 4: 44,89, October – December, 2004.http://www.cdrb.org/journal/2004/4/mainul.pdf
HALID, Fazlun M. Islam and environment. In: Encyclopedia of global environmental change. Volume 5: social and economic dimensions of global environmental change. Chichester: John Wiley & Sons, Ltd., 2002.
SAFAR, Martin. Islamic environmental Law. Graduate thesis. University of Ljubljana. Faculty of Law. Ljubljana, 2007.http://martinsafar.wordpress.com/2008/09/15/islamic-environmental-law/



A questão da falta de tempo


Pois é, não vou nem pedir desculpas, pois não tenho nenhum seguidor deste blog...confesso que pensei em reativar meu blog, afinal, estou pesquisando sobre o tema, é minha futura dissertação de mestrado, mas... trabalho, família e estudos é igual à páginas em branco. Vamos lá! Sem arrependimentos, continuar minha escrita. Wassalam.

A história das coisas

quinta-feira, 15 de julho de 2010

Islã, meio ambiente e a utilização do "Vetiver Grass" no Senegal.

Em nome de Deus, o Clemente, o Misericordioso.

Tenho pesquisado bastante na internet e encontrei um artigo interessantíssimo escrito, não por um proeminente teólogo ou ambientalista, mas por um muçulmano simples, educador, fazendeiro, que divide seu tempo entre o Reino Unido e o Senegal. Seu nome é Tony Cisse. O que me chamou a atenção é o fato dele aliar teoria e prática. É disso que precisamos. Entretanto, não há tempo e espaço para reproduzir tudo o que escreveu. Vou direto ao assunto, pinçando algumas ideias que considero as mais importantes.
A maioria dos estudos e pesquisas realizadas mostra que é nos países do Sul que se encontra a forma mais aguda da crise ambiental mundial. Esses países são os que mais dependem dos recursos naturais para o desenvolvimento. No caso do Senegal e de outros países africanos, os principais problemas são os repetidos ciclos de seca, a erosão costeira, a desertificação, as queimadas, o desmatamento, resultado da ação humana desordenada.
Milhões de pessoas em todo o mundo estão morrendo ou encontrando suas existências ameaçadas como resultado direto da crise. O mais interessante é que o Alcorão previu tal crise:

"A corrupção apareceu, na terra e no mar, pelo que as mãos dos homens cometeram, afim de Ele fazê-los experimentar algo do que fizeram, para retornarem." Alcorão 30:41

Entende-se por corrupção as desgraças que assolam a humanidade periodicamente: a seca, a escassez de alimentos da terra e do mar, as pragas, etc. Tais calamidades podem ter suas causas ligadas à ganância e à falta de manejo no uso dos recursos dados por Deus. Outra causa é o consumo irrefletido!
Segundo Ziauddin Sardar: "As raízes da crise ambiental são axiomáticas, estão em nossas crenças e estrutura de valores, que moldam nossa relação com a natureza, uns com os outros e os estilos de vida que levamos."
É raro ouvirmos muçulmanos proeminentes falando sobre questões "verdes". Exemplos de boa gestão ambiental, infelizmente, são difíceis de ser encontradas em países de maioria muçulmana. Nas palavras de Mustafa Abu-Sway: " Nenhum governo no mundo muçulmano está prestando atenção a esta questão em um nível importante." Todavia, o Alcorão e os hádices (ditos do Profeta Muhammad) são enfáticos no que concerne a proteção do meio ambiente como um elemento central da fé. Dr. Rahim Zillur Hassan, falando sobre a natureza holística do Islã afirmou que: "Tudo na criação está ligado a todo o resto, o que afeta uma coisa, acaba afetando tudo o mais. O homem foi destilado a partir da essência da natureza e, por isso, está intimamente ligado à ela."
De acordo com o Alcorão (6:165) o ser humano recebeu a responsabilidade ou mordomia sobre a natureza, cabendo à ele compreendê-la, respeitá-la e agir de acordo com os sinais fornecidos por Deus (Alcorão 45:3-5).
Por hoje fico aqui. Wassalam.



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