A Relevância da Iniciação à Pesquisa Científica na Universidade
Newton Aquiles von Zuben
Qualquer iniciativa visando pensar a Universidade, afim de reconstruí-la como lugar eminente de ensino, de criação de conhecimentos e de serviços à comunidade, deve estar atenta ao sentido da pesquisa, tanto em seu sentido lato como busca de conhecimentos, quanto em seu significado estrito como criação de novos conhecimentos à luz do acervo cultural estabelecido pela tradição. É razoável pensar-se numa relação dialética entre as duas idéias: a de pesquisa e a de Universidade. Não são separáveis, ao contrário, articulam-se e são co-determinantes. A Universidade engloba no seu seio as mais diversas manifestações da cultura humana, nas ciências, nas artes, na literatura, na filosofia. É o espaço eminente onde se organizam todas as criações do "espirito" humano. Do mesmo modo deve-se atentar para as modalidades e as especificidades destas criações. O fato da "busca", da "pesquisa" é, se assim posso me expressar, universal. Veremos mais adiante como, já desde Aristóteles, os homens reconhecem como "natural" o desejo de conhecer. Mas a maneira pela qual cada um desenvolve esta "busca", esta "pesquisa", não é a mesma. Deve-se distinguir, em outros termos, o sentido mesmo da pesquisa nas diversas áreas do saber.
A importância o projeto pedagógico de iniciação à pesquisa parece já estar estabelecido de modo consensual, uma vez que não seria fácil apresentarem-se argumentos plausíveis contra tal projeto. Sendo atribuída à Universidade a tarefa de busca do saber em toda a sua extensão e profundidade, assim como a transmissão desse saber do modo mais racional possível, parece impor-se a necessidade de uma propedêutica à busca do saber. A criação de conhecimentos novos é tributária da apropriação de conhecimentos já estabelecidos. Isso é válido tanto nas ciências como em filosofia ou nas artes. A apropriação do repertório de conhecimentos que a humanidade produziu até o momento se dá, de modo crítico e sistematizado, eminentemente na Universidade. Pois bem, creio que, na medida em que se atenta às exigências de criticidade, é necessário ultrapassar-se o nível, diria, deste senso-comum" que acredita que a pesquisa científica seja evidente. Reafirmo, pesquisar parece-nos algo evidente. Porém, a pesquisa científica deve responder a alguns quesitos específicos para que sua cientificidade possa ser aceita. Por outro lado, como se apresenta uma Universidade que não corresponde ao estatuto da pesquisa nas ciências, em filosofia, na literatura, nas artes? Em outros termos, que sentido tem uma Universidade que não erige a prática da pesquisa como um dos pilares essenciais em sua instituição? Será essa uma Universidade criativa ou simplesmente uma Universidade conservadora, reprodutora, meramente informativa onde alguns "falam" - os professores - e muitos ouvem" - os alunos.
Afirmar a relevância da iniciação à pesquisa científica significaria, então, tentar "compreender" o seu autêntico sentido e, assim, estabelecer a sua tarefa no seio da Universidade. Compreender o sentido: eis a tarefa do questionamento elaborado pela reflexão filosófica. Compreender = apreender em conjunto. Sentido como direção e como significado. Apreender a significação no seio de um horizonte que lastreia e possibilita sua manifestação, sua realização. Instaurar sua direção = apreender o processo e a finalidade desta manifestação no seio do conjunto. A relevância da iniciação à pesquisa científica deverá mostrar-se justamente na inserção deste projeto no seio da Universidade na sua correlação com as diversas dimensões da tarefa que a Universidade se atribui a partir de sua "idéia instituinte".
Tais são as questões que desejaria desenvolver neste trabalho com pretensões modestas, pois limita-se a lançar pistas para discussões e não oferecer respostas decisivas ou definitivas. Observo, de pronto, que o termo pesquisa apresenta inúmeros aspectos: o epistemológico, o metodológico, o social e o ético. A propósito deste último, os problemas éticos lançados pelo desenvolvimento das ciências bio-médicas têm aflorado, na literatura especializada, no campo da bioética, desde a década de 80. Não poderei, dado o limite deste trabalho, abordar todos estes aspectos.
Esta temática provoca nossa reflexão de modo especial neste final de século, época em que nossa percepção parece captar de modo mais intenso a celeridade das mais diversas mudanças. Tais transformações são marcantes, diria mesmo radicais, e suas conseqüências chegam a perturbar o homem em sua visão de mundo, em seus valores, sua cultura e seu modo de ser e de agir.
Proponho, num primeiro momento, considerações sobre a Universidade e sua inserção na sociedade. Em seguida, como se articula, no projeto da Universidade, a prática da iniciação à pesquisa científica. Como horizonte filosófico de sentido, poderia sugerir a idéia básica de uma das mais notáveis criações do pensamento ocidental contida no par 'teoria - prática". Como criação foi notável, mas os embaraços por ela causados sentimos ate hoje.
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